A possibilidade de ordenação de homens casados ao sacerdócio na região amazônica foi um tema abertamente discutido durante o Sínodo dos Bispos realizado em outubro de 2019. Mas o Papa Francisco nunca abraçou essa ideia de verdade. Ele é contra o fim do celibato e tem ressalvas quanto à sua flexibilização.
Por várias vezes, ele defendeu o celibato (veja abaixo) e, embora permitisse que o debate ocorresse livremente no Sínodo, afirmou que jamais seria capaz de acabar com a norma que proíbe os padres católicos do Ocidente de serem casados.
Para Jorge Mario Bergoglio, o celibato “é um dom para a Igreja”.
Em diversas ocasiões, ele manifestou essa ideia. Mas muito se especulava sobre se ele teria sido convencido no Sínodo a abrir uma exceção para a Amazônia.

Agora, às vésperas da publicação do documento do Papa sobre o Sínodo da Amazônia – sua exortação apostólica pós-sinodal intitulada “Querida Amazônia” – uma reportagem da agência Catholic News Service (CNS) sinaliza que, aparentemente, nenhuma mudança será feita durante este pontificado.
O Papa teria dito a bispos dos Estados Unidos que as pessoas focadas na possibilidade de ordenação de homens casados ao sacerdócio e de mulheres ao diaconato ficariam decepcionadas com seu texto, segundo a reportagem.
Os ‘viri probati’ na Amazônia
Uma nova flexibilização da regra do celibato na Amazônia seria algo significativo, mas não inédito: nas igrejas orientais já existem padres casados e, mesmo no Ocidente, o Papa Bento XVI permitiu que padres anglicanos pudessem se converter ao catolicismo mantendo suas esposas e famílias.
No caso da Amazônia, a ordenação de homens casados de boa reputação (os chamados “viri probati”) foi apresentada por alguns bispos como uma solução para melhorar o acesso dos fiéis aos sacramentos. Há comunidades onde o povo tem missa só uma vez por ano.
O argumento deles, baseado em pensamentos do Papa João Paulo II, é de que o que reúne uma comunidade cristã é a Eucaristia, a comunhão em torno do altar. Sem um sacerdote capaz de presidir a celebração, a comunidade permanece sem o principal: a presença real e a comunhão com Cristo.
Os diáconos são homens ordenados, mas cuja missão é o serviço. Por isso, têm funções diferentes das de um presbítero (padre). Podem batizar, testemunhar casamentos, pregar e conferir algumas bênçãos.
Mas o foco deles é a caridade. Por isso, não têm a capacidade de celebrar a Eucaristia nem ouvir confissões nem ungir os enfermos. A proposta mais forte no Sínodo era a de ordenar os diáconos para o sacerdócio, mesmo casados.
Em nenhum momento o Sínodo cogitou o fim do celibato.
Francisco é contra o fim do celibato
Uma das suas declarações mais claras sobre o tema foi durante a coletiva de imprensa de retorno do Panamá a Roma, em 27 de janeiro de 2019, quando ele disse:
“Pessoalmente, acho que o celibato é um dom para a Igreja. Eu não concordo em permitir o celibato opcional, não.”
Papa Francisco, 27 de janeiro de 2019
Nessa mesma ocasião, ele repetiu uma frase do Papa Paulo VI: “Prefiro dar a vida antes de mudar a lei do celibato.” Frase que ele chamou de “corajosa”.
Ele disse, ainda, que absolutamente não se sente “confortável diante de Deus” com a decisão de transformar o celibato em uma regra opcional, como ocorre nas igrejas orientais.
Mas poderia-se pensar, no futuro, em uma forma de facilitar o acesso à Eucarista a cristãos de zonas mais remotas, como a Amazônia e as Ilhas do Pacífico.

Não é para já
Esta reportagem do site Religion News diz que Francisco não acredita que “o Espírito Santo esteja trabalhando nisso agora”. Ou seja, pensar em mudar o celibato não é para já. Eventuais exceções à regra devem ser avaliadas com mais calma e discernimento, segundo ele.
A conclusão faz sentido: o Sínodo da Amazônia reuniu principalmente representantes da igreja local. Mas a lei do celibato é uma regra geral da Igreja.
Além de o Papa ser um defensor do celibato, uma alteração desse porte talvez exija uma consulta mais representativa para colocar em prática o que ele chama de “sinodalidade”, isto é, a ideia de governar a Igreja de mãos dadas ao povo e aos outros bispos do mundo inteiro.
No quesito celibato, o Papa Francisco se apresenta em plena sintonia com seus antecessores, conforme ele mesmo afirmou em um livro sobre João Paulo II:
“Estou convencido de que o celibato é um dom, uma graça, e caminhando nos passos de Paulo VI, e depois de João Paulo II e Bento XVI, sinto fortemente a necessidade de pensar no celibato como uma graça decisiva que caracteriza a Igreja Católica romana.”
Papa Francisco, no livro “Giovanni Paolo Magno”, com Pe. Luigi Maria Epicoco
